Esta pequena história acabada de ler-se (25,1-13) pode ter sido recolhida por Mateus, que a apanhou quando, numa estadia de Jesus com os discípulos no fim dos seus dias, em Jerusalém, este lhes contou muitas outras parábolas (Mt 21,18 – 22,14).
Embora fale do perigo, da ameaça, do juízo, da condenação, do sofrimento e da morte, não se pode – diz ele – perder a alegria que sempre tem de encher o nosso viver, de encher a nossa vida.
Jesus não contou uma parábola sobre a parusia (uma vinda de Jesus), nem do seu fim pessoal ou da História.
O noivo de que se fala é Deus, o noivo da noiva “Israel, esposa infiel de Deus que viverá para sempre com ela, conforme a justiça e o direito, com misericórdia e amor” (Os 2, 21-22).
Não se trata, portanto, de medo diante do juízo final ou de Deus, mas de se ser cristão, seguindo Jesus e, portanto, viver em alegria a felicidade.
Que temos e teremos limitações e misérias, disso ninguém duvida.
Mas ninguém pode tirar-nos ou diminuir-nos a constante alegria do que vive e vai viver uma festa que é o Reino de Deus.
…
«Nós somos mulheres e homens deste tempo, somos do hoje, do aqui e agora, ou seja, somos chamados a assumir, em cada situação concreta, a nossa humanidade, com o que isso comporta de história, de civilização e de cultura, de sonho e de projeto.
Nada do que acontece no mundo em que vivemos nos pode deixar indiferentes. Alegrias e tristezas, certezas e dúvidas, glórias e fracassos, … tudo o que é humano tem a ver connosco, tem a ver comigo.
Ser cristão — e mais ainda, cristão leigo — é viver neste mundo, com lucidez e com empenhamento. É viver como a outra gente, vida aparentemente igual à dos outros homens e mulheres, mas vida vivida com a consciência de que Jesus está no meio de nós, que faz caminho connosco, como demonstrou aos discípulos de Emaús (Lc 24,23…). É viver com a fé que Deus está a criar, pela ação do seu Espírito Santo, os novos céus e a nova terra, no seu eterno presente, sabendo que cada um/a de nós é obreiro/a singular e único, deste projeto.
Viver com paixão o presente é sinal do reino de Deus nas circunstâncias concretas em que nos é dado existir, ou seja, é estar atento/a aos sinais dos tempos e procurar descobrir neles aquilo que poderá ser fermento de um pouco mais de verdade e transparência na minha vida pessoal e nas minhas relações com os outros; um pouco mais de fraternidade e de solidariedade à nossa volta, nas relações laborais ou na participação cívica e política; um pouco mais de concórdia e de tolerância e de paz em todas as situações.
Viver com paixão o presente é fazer-se próximo/a daqueles e daquelas que mais precisam da nossa ajuda: os pobres, os doentes, os idosos, os que estão sozinhos, os presos, os injustiçados, os que, diariamente, são atirados para a margem do sistema socioeconómico e caem no desemprego, na precaridade ou mesmo na exclusão social.
Viver com paixão o presente é ser portador de esperança e de um são otimismo, valores tanto mais relevantes quanto vivemos num tempo que, apesar de todos os triunfos já alcançados, é um tempo marcado por um grande desencanto e um grande temor.
… É próprio dos tempos de crise que se generalizem sentimentos coletivos de índole depressivo. E nós, certamente, já os experimentámos, talvez em nós próprios/as e, seguramente, em algumas pessoas à nossa volta, para quem sempre tudo vai mal.
… Ser cristão ou cristã, no tempo presente, implica a superação destes três tipos de tentações: o conservadorismo, a inércia, a aceitação acrítica da cultura dominante.… Esta mulher e este homem novos são os discípulos de Cristo, continuadores da sua missão, a que a Igreja no seu todo dá expressão e visibilidade, no mundo contemporâneo.» (Manuela Silva – Utopia cristã e aventura humana, Multinova, 2002, p. 235)