Voltar às fontes não é fazer arqueologia, nem há qualquer primitivismo em voltar ao Desígnio que nos vocacionou. A nossa renovação não será nem reforma nem contra-reforma. Os vinte séculos quase a completar-se estão cheios de construções históricas que fizeram o seu tempo, que foram do seu tempo, muito provisórias, muito discutíveis, e que não é preciso “canonizar” de maneira nenhuma. Nem tudo foi bom, nem tudo foi perfeito, e houve muita coisa que foi francamente má. Mas também houve muita coisa, muito trabalho feito, muita edificação avançada, muita aquisição para o futuro, muito desenvolvimento que é preciso não alienar. O balanço a que procedeu o Concílio Vaticano II não foi uma liquidação nem um encerramento para obras de “restauro”…
Quando se fala de voltar ao Baptismo, fonte da nossa comum dignidade, para que os Leigos descubram o seu lugar na Igreja e no Mundo, não se faz obra de restauro… É impossível encontrar o lugar dos Leigos na Igreja e no Mundo, sem que se discuta o lugar dos Padres na Igreja e no Mundo. Uma coisa não vai sem outra. Não se pode fazer uma teologia do Laicado sem que se reveja a teologia do Episcopado, do Presbiterado, do Diaconado, e dos outros ministérios…
Vai ser precisa muita coragem e muito desassombro para as grandes mudanças que nos esperam. O que estamos a passar é exactamente uma transição. Somos uma fase de transição, o que nos deveria tornar prudentes, quando fazemos determinadas afirmações, ou quando pretendemos antecipar-nos às mudanças inevitáveis e necessárias que a seu tempo se darão. O que assistimos nestes dias é a uma vontade deliberada da parte dalguns de fechar portas e de trancar-se atrás de “certezas” que estão muito longe de fazer a unanimidade na Igreja. Os “mandarins” parece que tomaram de novo a dianteira, mas não preciso levá-los muito a sério, nem temê-los demasiado, a estes “arqui-apóstolos!… Aquilo que fará avançar a Obra de Cristo e nos dará poder para vencer e remover todos os obstáculos que têm impedido a realização plena da vocação, é uma forte e clara consciencialização. Abrir os olhos, eis o que é importante: o resto será o desencadeamento imparável da Graça. Nada resistirá, nem os “Mandarins” que nestes dias parecem condicionar os desenvolvimentos do Vaticano II conseguirão travar as grandes mudanças que já se adivinham….
A noite, a longa noite “em que ninguém pode trabalhar” está a passar, e um novo dia já amanhece, em que os grandes trabalhos do Século vão exigir dos discípulos da Hora “que despertem, e se levantem dentre os mortos”…
O importante é abrir os olhos. Nossa renovação agora é toda teológica, não no sentido livresco ou doutoresco, mas no sentido da Fé, da Caridade e da Esperança. Trata-se da nossa refontalização. Fazer coisas? Muito bem. Há sempre coisas para, fazer. Mas aqueles que se entregam à refontalização é que fazem neste momento o trabalho mais importante, o trabalho sobre eles próprios, o trabalho de se tornarem o que são, de se converterem ao que são…
Evangelizar o Mundo? Sim, sim! Mas com quem? Com quê? Evangelizar, o que é? Como é que a Igreja pode converter o Mundo, se ainda não se converte a si própria?
Não vamos “fechar para obras”. Não vamos parar, para o “pequeno almoço”, Não se trata disso.
A nossa questão não é de cronologia. Não é fazer uma coisa depois de fazer outra. É uma questão de CORAÇÃO, é uma questão de ATITUDE. Quem de nós terá a paixão do ESSENCIAL? O essencial é que é importante. O essencial é tudo! O nosso Século não tem falta de políticos, de economistas, de projectistas… O nosso Século tem falta de Cristãos! Sim, disso é que tem falta. Não tem falta de papas, de bispos, de padres. E em breve vai ter muitos diáconos. A Igreja não tem falta de ministros. A Igreja tem falta de Cristãos… e não tem muita falta de “leigos”…
Pe. Leonel de Oliveira, 1987.03.29 – 4º Domingo da Quaresma