Irmãos:
De todos os tempos litúrgicos, foi o Advento aquele que mais lenta e tardiamente se fixou. Entre muitas outras razões porque, face à crescente e rápida importância que a festa do Natal adquiria no Ocidente, Roma tentava impedir uma igualdade da importância do Natal com a Páscoa que fizesse do Advento uma espécie de quaresma natalícia, de preparação e penitencial, como a pascal.
O debate processou-se. As igrejas orientais e todas as que lhes estavam ligadas (a da Hespanha incluída) salientavam um Advento preparador do Natal, melhor, do Natal oriental que era a Epifania. Esta festa tinha um forte acento baptismal e precisava, ao jeito do que acontecia com a Páscoa, de um tempo de preparação que fosse também de apronto final dos catecúmenos.
No Ocidente, porém, as coisas aconteceram de modo diferente. Se, por um lado, dada a feição episódica do Nathale Solis Iustitiae (Nascimento do Sol da Justiça), o Advento privilegiou bastante a nota de memória da expectativa que preparou o nascimento do Filho de Deus, é também verdade que entendeu sempre essa mesma expectativa como sinal e anúncio d’Aquele que há-de vir no fim dos tempos a julgar os vivos e os mortos, segundo a fórmula AQUELE QUE VEIO É AQUELE QUE HÁ-DE VIR.
Digamos que, nesta perspectiva, as duas componentes do Advento estão intimamente ligadas, e teológica e liturgicamente correctas: celebrando-se O QUE HÁ-DE VIR, celebramos também O QUE JÁ VEIO que é O MESMO QUE VEM HOJE.
Antigamente, a divisão do ano litúrgico não se fazia tão nítida como hoje. Não havia propriamente um ano litúrgico a que se seguia outro ano litúrgico: havia uma concepção diferente e mais dinâmica do tempo litúrgico, um tempo irrepetível porque sempre novo, ultrapassando, portanto, o antigo mito do “eterno retorno”.
Só que… os livros litúrgicos, os missais tinham de ter um princípio, qualquer que ele fosse: uns começavam com a Novena do Natal, outros com a Páscoa e sua preparação, depois o Pentecostes; mas espalhavam-se então uns tempos soltos, tempos comuns…!, complicado!
… viria então com o tempo a impor-se universalmente que a divisão do ano se fazia pelo termo a que depois começou a chamar-se Advento. Por essa razão ele passou a ser o primeiro tempo do ano litúrgico, se bem que, como sabemos, a sua temática seja igual à dos últimos domingos do Tempo Comum. Digamos que, no princípio, a divisão que no início não se fazia (pelo menos aqui) marcava agora melhor um tempo que era para frente e para o alto, e não repetitivo porque sempre novo.
Este é, portanto, o sentido mais autêntico deste Advento que começamos, fixado depois de uma longa decantação feita pelo tempo: o Advento só se fixaria definitivamente de facto na Baixa Idade Média.
«Velai, pois, e orai em todo o tempo» – é, no entanto, hoje, a grande palavra da Liturgia às Igrejas, nestes dias.
Estar, portanto, na Vida de olhos postos no Futuro e no Senhor que vem Hoje: «A sua vinda última será, com efeito, semelhante à primeira… pois também hoje os fiéis desejam recebê-lo no seu próprio tempo», explicava no séc. IV o Diácono Stº. Efrém) para que, depois, não tenhamos de envergonhar-nos do nosso Passado.
De olhos postos no Futuro, portanto, é necessário perceber que o que em cada momento está em jogo é sempre maior que cada um de nós: é o Futuro da Terra e do Homem, e a Glória de Deus. O Advento tem também, portanto, de ser um tempo que ajude a Igreja a libertar-se do feroz individualismo que nela se instalou e que parasita as suas melhores energias, inserindo-se no desígnio de Deus.
Vigiemos, portanto, irmãos, estejamos atentos a fim de podermos descobrir a passagem de cada Tempo e Situação, de que não ficará pedra sobre pedra e de percebermos o que nasce de novo no seio do tempo, cheio sempre de Eternidade.