A pregação profética de João, um pouco mais velho que seu primo Jesus, pôs tudo de pernas para o ar, sobretudo do Templo e, de cima para baixo, da Galileia até à Judeia.
Algo acontecia. Um pouco o mesmo que agora vivemos, com a pandemia Covid-19: mesmo sem querer é necessário mudar tudo: os costumes, a forma de vida, costumes e regras de conduta, alterar não só a vida de algumas pessoas, mas de todas as comunidades e mesmo de todas as sociedades.
Começa-se a sentir que é preciso mudar, reformar, recriar… Eu fui professor de Teologia Pastoral …, e começam já a ser bastantes e não só de perto, antigos alunos e colegas que me pedem que os ajude a perceber que fazer…
João… não vinha do Templo, apesar de seu Pai, Zacarias, ser um sacerdote do Templo (Lc 1,57). João não quis servir o Templo. Foi para o deserto e viveu ali “até se apresentar a Israel” (Lc 1,80). Portanto, João não tinha nada que ver com o Templo, nem com os sacerdotes, nem com o sagrado. Deus enviou-o a ele para preparar a Boa Notícia, o Evangelho.
E o povo respondeu ao chamamento de João. Aproveitou as águas do rio Jordão e arranjou um gesto real, mas simbólico: meter-se na água, todo ele e sair logo. Era um morrer e nascer de novo.
Aparece Jesus, a somar essa massa de toda a gente pecadora, desorientada, a quem João chamava raça de víboras (Lc 3,7b). Jesus meteu-se na fila dos pecadores, misturou-se com o povo, como mais um de tantos (Fl 6,7-9). Digamos que Jesus incarnou no humano, entre a massa da gente, entre o povo e como o povo. Este foi o ponto de arranque da grande lição que Jesus nos deu: o mais humano revelou-nos o divino.
Os evangelistas Mateus, Marcos e Lucas (Mt 3, 13…, Mc 1,9… e Lc 3,21) registam o que aconteceu.
«Por aqueles dias, Jesus veio de Nazaré da Galileia e foi batizado por João, no Jordão. Quando saía da água, viu os céus abertos e o Espírito descer sobre ele como uma pomba. E do céu veio uma voz: Tu és o meu filho muito amado!» (Mc 1,9-11).
Quando Jesus saiu das águas batismais do rio Jordão o céu abriu-se, e desceu uma pomba. Marcos filmou: «Quando saía da água viu os céus abertos e o Espírito descer sobre ele, como uma pomba. E do céu veio uma voz: “Tu és o meu filho muito amado, em ti pus o meu encanto”» (Mc 1,9-11). Era o Espírito Santo!, parecia uma pomba! (Mt 3,16).
A pomba é uma ave muito simples e bela. Quando eu andava na escola, em Balteiro, não parei enquanto o meu Pai não me conseguiu uma pomba… A minha professora deu-ma, o meu pai tratou de um pombalinho. Necessita de muitos cuidados…
A pomba era no mundo antigo uma coisa…! A beleza do seu voar!
A pomba acabou por parecer àquela gente Deus a descer céu abaixo, o Espírito Santo!
«Sobre o reino repousará o espírito do Senhor» (Is 11,2): «O espírito de Deus está sobre mim» (Is 61,1), sempre tudo representado por uma pomba. Logo no fim do dilúvio, a pomba fora verificar se as águas ainda cobriam a terra! (Gn 8,8…)…
Este pensar da sacralidade da pomba chegou à liturgia e à arte sacra e mesmo à linguagem simbólica do nosso tempo, até a teológica.
Mas voltemos ao encontro de Jesus com João nas bordas do Jordão. Depois de João haver batizado o primo Jesus, depois de todos perceberem que tinha «descido o Espírito Santo!, parecia uma pomba!» (Mt 3,16), houve logo problemas entre os seus discípulos: «levantou-se uma discussão entre os discípulos seus e os de João e um outro judeu, acerca dos ritos de purificação» (Jo 3,25). Mas João não se incomodou que algum(s) dos seus discípulos o tenham abandonado e seguido no grupo de Jesus (Jo, 3,25-26).
Foi então que se aclarou quem era João: «Eu não sou o Messias, mas apenas o seu enviado à frente» (3,28).
Resumindo. A Jesus, tal como a seu primo João, não lhe interessou o Templo e seus sacerdotes, nem os rituais, os sacrifícios, as leis e as normas. Para Ele era claro que o mais preciso era ajudar os que, pela honestidade e até pelo sofrimento, lutam a encontrar o caminho que nos leva a Deus.