Comer em comum

Diego Rivera, ‘Banquete en Wall Street’ (1928)

  1. Comer em comum — um simpósio, assim se chamava — tinha nas culturas antigas uma importância que hoje se perdeu. Comer em comum é ainda hoje um acontecimento de medição e até de integração social. A categoria social de cada comensal refletia-se na postura e no lugar que ele ocupava no banquete. Os importantes da classe superior comiam recostados em divãs, os pobres e escravos comiam de pé ou no chão. É importante saber isto, pois que “a grande maioria da gente que vivia no império romano era pobre” (Robert knapp).

E por isso se compreende a importância que têm, nos evangelhos, as comidas de Jesus. E entende-se também a importância e o cuidado que Jesus punha naquelas comidas que, compartidas, se celebravam conforme a determinada ordem social. Por isso, Jesus não tolerava as pretensões de importância e honra que os fariseus mostravam. Eles consideravam-se os primeiros, na “ordem do religioso”, e empenhavam-se em deixar isso claro igualmente na “ordem do secular”.

  1. Por isso, Jesus viu claramente que, entre “importantes” e “plebeus”, o mais eficaz era cortar pelo são. Daí, o empenho de Jesus pôr os “últimos” no sítio dos “primeiros”, os primeiros mandá-los lá para trás e pôr nos lugares de cima os últimos e os pobres. Se isso fosse possível, dava-se um passo decisivo para o nascimento de uma sociedade igualitária, em que todos fossem irmãos humanos.

«Quando alguém te convidar para um banquete nupcial, não tomes o primeiro lugar. Pode alguém de maior consideração do que tu ter sido também convidado por ele, e ele, que te convidou a ti e ao outro, ter de vir dizer-te Cede o teu lugar a este convidado. Tu, envergonhado, terás então de passar para o último lugar. Quando fores convidado, vai tu para o último lugar, e quem te convidou dir-te-á assim que chegar Amigo, chega-te mais cá para cima.» (Lc 14, 8-11)

  1. Jesus fala de uma comida compartida, de uma reunião comensal…: as comidas de Jesus. Comer a uma mesma mesa é partilhar da mesma vida: à mesa se fala da saúde, da alegria, da intimidade, da aproximação humana, do sofrimento… Que mais se pode pedir ou fazer?

Não se tratava nem de baixar ou melhorar a qualidade da comida posta na mesa por causa deste ou daquele que… Os privilégios, as distinções, as maiores ou menores importâncias…

Jesus cortava “pelo santo” estabelecendo assim a escala da prioridade: os primeiros da mesa têm de ser os últimos na escala social e os convidados ao almoço têm que ser os que ninguém convida nem os querem ser. Isto é, o que Jesus apresenta é uma inversão total de valores, de critérios éticos e de princípios sociais.

A desprestigiada religião bem como a desprestigiada Igreja (que ainda não existia) terão de assumir, no futuro, critérios de subversão sem contemplações.

  1. Neste episódio não se fala simplesmente de um publicano, mas de um chefe de publicanos. Zaqueu. Era um chefe.

Um “chefe de publicanos” era uma pessoa importante. Tinha publicanos a seu serviço que tratava como escravos, homens odiados pelo povo, pois que extorquiam os mais débeis, obrigando-os a pagar impostos muito gravosos, isto é, roubavam-nos no sentido exato da palavra: roubavam na quantia que haveriam de entregar ao chefe, chefe dos publicanos, e na quantia que ficava para eles. Por isso publicanos e chefes dos publicanos eram muito ricos.