“Não haverá vida para os pobres num ambiente degradado; e não protegeremos o ambiente se nos esquecermos dos excluídos”. Assim acabei a homilia anterior. Esta dupla problemática — os pobres e um ambiente degradado — é um tremendo desafio. Não basta boa vontade para lhe respondermos.
Por isso, o Papa Francisco propõe um conceito novo: ecologia integral, isto é, o cuidado de tudo o que é vida, na multiplicidade das suas formas. A ecologia integral não consiste só e unicamente na defesa da natureza mas na proteção de tudo o que é vida, incluindo a humana, sobretudo onde se encontra em perigo.
A palavra ecologia (oikos + logos > tratado da casa) até há pouco tempo referia-se apenas à vida da natureza: que era necessário proteger os espaços naturais, lugares de beleza e harmonia, defender as espécies animais e vegetais, respeitar a água… Entendida desta maneira o que seja a ecologia, temos de dizer que já há muitos anos há muitas organizações a trabalhar na defesa do ambiente.
Entretanto, a seu tempo, João Paulo II falou já numa “ecologia humana”: “Além da destruição do ambiente natural, é de recordar outra ainda mais grave, a do ambiente humano, a que estamos ainda longe de prestar uma necessária atenção” (Centesimus annus 38).
Francisco dá agora um passo em frente: “Não pode ser autêntico um sentimento de união íntima com os outros seres da natureza, se ao mesmo tempo não houver no coração ternura, compaixão e preocupação pelos seres humanos” (LS 91).
Portanto, a ecologia integral acrescenta à ecologia da natureza uma sólida preocupação pela vida humana, pelo bem comum, que exige respeito pelos direitos inalienáveis de cada ser humano e pelo tecido social (pessoas e instituições que garantem o ordenamento social e político). O bem comum está, portanto, acima de legítimos interesses particulares quando estes atentam contra os direitos dos outros seres humanos.
O bem comum apela à solidariedade e reclama a opção preferencial pelos mais pobres: “Nas condições atuais da sociedade mundial, onde há tantas desigualdades e são cada vez mais numerosas as pessoas postas de lado, privadas dos direitos humanos fundamentais, o princípio do bem comum torna-se imediatamente, como consequência lógica e inevitável, um apelo à solidariedade e uma opção preferencial pelos mais pobres” (LS 158).
Esta ecologia integral não pode esquecer a justiça entre gerações: temos a obrigação de deixar aos que viverão depois de nós um planeta em que eles possam viver e desenvolver-se como seres humanos em plenitude. Os nossos direitos não estão por cima dos deles.
Estendeu ainda mais o conceito de ecologia integral o Papa Francisco, lembrando a proteção das culturas num tempo em que assistimos a uma globalização cultural que está a pôr em risco numerosas, ricas e diferentes culturas humanas. Uma autêntica ecologia tem de respeitar estas formas culturais que carregam uma sabedoria e uma riqueza que remontam a sociedades anteriores à nossa, em que havia um conhecimento profundo do significado do ser humano.
Uma ecologia integral aponta também uma “vida boa”, isto é, digna de ser vivida e profundamente humana. Para isso, nós temos que conviver em harmonia com os mais seres humanos e com as demais realidades, ajudando-as a crescer.
O Pai, criador da vida, convida-nos a gozá-la — a “vida boa” — e a celebrá-la, a descobri-la, a admirá-la, a cultivá-la e a respeitá-la, tornando-se cada um de nós mais humano no processo. Esta é, sim, uma ecologia integral.
Arlindo de Magalhães, 4 de Junho de 2017