Contrariamente aos rabinos do seu tempo, que, à volta de uma sinagoga, se rodeavam de alguns poucos discípulos, Jesus era um Mestre – um Rabi – itinerante: “percorria as cidades e aldeias, ensinando nas sinagogas” (Mt 4,23). Ou seja, não se sentava à espera que discípulos e outros o procurassem, ia antes ao seu encontro, à sua situação de vida.
Jesus não era também como os sacerdotes do Templo, que simplesmente recolhiam os animais que iam ser sacrificados e com o dinheiro dos fiéis, mas com estes não se preocupavam nada.
Jesus não procedia como os fariseus, que só ligavam às elites. Ele dirigia-se “em primeiro lugar, às ovelhas perdidas da Casa de Israel” (Mt 10,6). Nem se reunia com os discípulos à maneira dos rabinos do seu tempo que se entretinham a discutir as minudências e casuísticas da Lei. Não!: Jesus antes corria andanças e acudia a necessidades. Por isso, depois de os escolher – no relato evangélico de hoje -, envia-os.
Esta perspetiva é absolutamente nova em Israel. Ele faz — envia — uma coisa que nem sacerdotes nem fariseus nem rabinos faziam, entupidos todos com o serviço religioso do Templo ou com a interpretação exata da Lei.
Os Evangelhos são muito claros. Começou pela Galileia…
A Galileia era um território situado a norte da Palestina (composta pela Samaria-Judeia (Jerusalém)-Idumeia), mas que não lhe pertencia. Por isso mesmo, chamava-se também “a Galileia dos gentios” (Mt 4,15). Jesus nasceu na Galileia, por ali cresceu e começou a sua pregação e passou a maior parte da sua vida. Uma vez por outra subiu a Jerusalém.
Quando em Março passado começou a pandemia, nós andávamos com ele “de cidade em cidade, de aldeia em aldeia, proclamando e anunciando a Boa Nova do Reino de Deus” (Lc 8,1).
A samaritana (a Samaria situava-se a sul da Galileia) encontrou-a no poço, o cego ao passar na aldeia sem nome (Jo 9,1), Zaqueu esteve com ele em Jericó, mas foi ele que disse que queria ir a sua casa (Lc 19,5), o centurião topou-o numa rua à entrada de Cafarnaúm (Mt 6,5), ainda mais para sul, já a sogra de Pedro, doente, foi visitá-la a sua casa, que nem sabemos onde era (Mt 8,14), os discípulos foi chamá-los ao lugar onde eles viviam, à borda do Mar da Galileia (Genesaré), onde consertavam as redes (Mt 4,21), Levi, talvez Mateus, estava no posto de cobrança em Cafarnaúm a receber os impostos (Mc 2,14); vinha a descer do monte e encontrou o leproso (Mt 8,1), ia de novo para Cafarnaúm, para casa de Jairo, e cruzou-se com a mulher que sofria de uma hemorragia havia mais de doze anos (Mt 9,20), ia para Tiro e Sídon e saiu-lhe ao caminho uma outra mulher cananeia (Mt 15,21), saía de Jericó e aparecem-lhe dois cegos que haveria de curar (Mt 20,29)…
Podia continuar-se esta lista dos encontros de Jesus. Mas já basta: ele andava ele sempre de um lado para o outro, à procura das “ovelhas sem pastor” (Mt9,36). Mais do que os episódios, é importante a sua atitude.
Muitos procuravam-no: Nicodemos (Jo 3.1 ss), a família (Mt 12,48), o jovem rico (Mt 19,16), numa palavra, as grandes multidões (Mt 21,8, Lc 6,17, etc.). Mas fundamentalmente era ele que andava de lugar em lugar a procurar e a deixar-se encontrar por todos.
Mesmo assim, não deixa de ser estranha – digamos – a recomendação que dá aos discípulos quando os envia em missão: “Não sigais o caminho dos gentios, nem entreis em cidades dos samaritanos. Ide primeiramente às ovelhas perdidas da Casa de Israel”. Era o particularismo judaico a funcionar! Os primeiros cristãos – judeus todos eles – herdaram-no dos seus maiores e projetaram-no depois no próprio Jesus; Mateus pô-lo a dizer “não fui enviado senão às ovelhas perdidas da Casa de Israel” (Mt 15,24), embora tenha sido ele próprio logo a dizer, no seu Evangelho de infância, que os Magos – pagãos – foram a Belém “adorar o menino” (2, 2), e colocado na boca de Jesus aquela palavra de espanto dita ao centurião romano, “não encontrei ninguém em Israel com tão grande fé!” (Mt 8,10), sinal claro de que “Deus até das pedras pode suscitar filhos de Abraão” (Mt 3,9).