Não há dúvida, meus irmãos: “Em virtude da dignidade batismal comum (a todos os batizados), o leigo é corresponsável, juntamente com os ministros ordenados e os/as religiosos/as da missão da Igreja” (CL 15,1). Ponto final parágrafo.
Todos somos, portanto, sujeitos da ação pastoral da Igreja. E, “os leigos, sejam quais forem, são todos chamados a concorrer, como membros vivos e com todas as forças que receberam da bondade do Senhor e por graça do Redentor, para o crescimento da Igreja e sua contínua santificação” (LG 33,1).
Mas o pós-Concílio faria uma precisão:
“a vocação específica dos leigos coloca-os no meio do mundo e à frente das tarefas as mais variadas na ordem temporal. (…) A sua primeira e imediata tarefa não é nem a instituição e o desenvolvimento da comunidade eclesial — esse é o papel específico dos Pastores — mas sim o pôr em prática todas as possibilidades cristãs e evangélicas escondidas, mas já presentes e operantes nas coisas do mundo. O campo próprio da atividade evangelizadora dos leigos é o mundo vasto e complicado da política, da realidade social e da economia, como também o da cultura, das ciências e das artes, da vida internacional, dos mass media e, ainda, de outras realidades abertas à evangelização como sejam o amor, a família, a educação das crianças e dos adolescentes, o trabalho profissional …” (EN 70,2).
Recordado isto, é preciso não esquecer o que já o Concílio prevenira: “A ação dos leigos dentro das comunidades eclesiais é tão necessária que, sem ela, o próprio apostolado dos pastores não pode conseguir, a maior parte das vezes, todo o seu efeito” (AA 10).
Nesta linha, porém, o mesmo Concílio deixou bem claro que “os presbíteros têm como primeiro dever anunciar a todos o Evangelho de Deus”, “exercem de modo eminente na Liturgia o seu múnus sacerdotal” e assumem “o múnus de Cristo-cabeça reunindo, em nome do Bispo, a família de Deus como fraternidade bem unida” (PO, 4, 5 e 6).
Resumindo. Cuidar da comunidade como um sinal do Reino dado ao Mundo é tarefa que cabe prioritariamente aos pastores; e construir o mundo segundo o Reino de Deus é a tarefa prioritária dos leigos.
É de Novembro de 75 um dos nossos grandes textos fundantes Destruir o Templo e descer o Monte (Folha dominical 28). Hoje, admiro-me dele, até da qualidade da formulação. Andou aqui por certo outra mão!
“Estamos habituados a enterrar os talentos, cá dentro do templo! E por isso não se sente no mundo a presença salvadora da Igreja. Mas como se há de sentir, se ela enterra os talentos debaixo de telhas? (…) É uma linguagem figurada esta. Precisamos de destruir o Templo. (…) Precisamos de deitar abaixo esta igreja velha, para que possa surgir a nova, Igreja de Pedras vivas, de cristãos conscientes e fortes na sua fé, caminhando seguros na Esperança do Reino, unidos, portanto na verdade da Caridade; Igreja que seja, de facto, Povo de Deus peregrino, em comunhão. Tudo o mais não interessa, tudo o mais é para destruir: destruir o Templo. E ao mesmo tempo, descer o Monte. A vida é lá em baixo, o mundo é lá em baixo, e a Igreja é para o Mundo, a Igreja não existe só nem principalmente dentro de portas. O horizonte da Igreja é o Mundo. (…) Destruir o Templo e descer o Monte – é a tarefa. Descer o Monte para lá em baixo, no Mundo, investirmos o nosso capital, a Palavra de Deus e o seu Espírito, originando presença salvadora. Descer o Monte para voltarmos a subi-lo, constituídos já um Templo Novo, Igreja de Pedras vivas”.
Leonardo Boff explicou muito bem: “a Igreja é aquela parte do Mundo que, na força do Espírito, acolheu o Reino de forma explícita na pessoa de Jesus Cristo… Não é o Reino, mas o seu sinal (concretização explícita) e o instrumento (mediação) da sua implementação no Mundo”.
É já um pouco velhinha esta linguagem, não é? Mas, não há muitos anos, os bispos portugueses disseram que “as profundas mudanças sócio-religiosas da sociedade portuguesa exigem uma fé adulta, esclarecida e fundamentada, que acompanhe a marcha da vida humana”.
É que — formulo eu — a Igreja caminha no Mundo e com ele para o Reino (Vaticano II, Gaudium et Spes, n.os 44 e 45).
Arlindo de Magalhães, 20 de maio de 2018