Hoje, no dia me que nos reunimos para homenagear a figura de Maria, mãe de Jesus, gostava de partilhar uma reflexão pessoal, não tanto sobre Maria, mas sobre as mulheres na Igreja.
A questão que me perturba e para a qual procuro resposta é a seguinte: “No tempo de Jesus, as mulheres tinham um papel relevante no anúncio da Boa Nova. No tempo da Igreja dos Homens, onde estão as mulheres?”
Do tempo de Jesus encontramos nos textos bíblicos e nomeadamente nos evangelhos, inúmeras referências a mulheres seguidoras da sua mensagem, seguidoras dos seus próprios passos (sozinhas ou com a família) e participantes ativas na evangelização.
Estavam presentes e muitas nomeadas, isto é, conhecidas pelo seu nome, tal o destaque que assumiam.
Nas cartas de Paulo encontramos notícias sobre a contribuição das mulheres na difusão da Boa Nova de Jesus nas comunidades paulinas, atribuindo-se-lhes mesmo o termo de “diaconisa” e “patrona” em alguns casos onde está patente o cargo de proclamação do Evangelho e de responsável (anfitriã) na comunidade a que pertenciam.
Assim sendo nas primeiras comunidades cristãs, esperar-se-ia uma transmissão da mensagem de Jesus, partilhada entre homens e mulheres, ao longo do tempo, até ao tempo presente.
Ora, aqui, é que perco o fio à meada! Onde estão as mulheres na Igreja de hoje?!
Puxo pelas minhas memórias de infância e paro aí pelos meus sete anos num facto insólito para mim, quando pela primeira vez a minha família (o meu pai, a minha mãe, eu e o meu irmão) não pôde assistir à celebração em conjunto como sempre fazia, pois na aldeia do meu pai, e em muitos outros locais do país, os géneros separavam-se à porta da Igreja. E obedeciam a um ritual: as mulheres entravam primeiro e instalavam-se em silêncio na retaguarda, enquanto os homens tagarelavam cá fora até o presbítero dar ordem de início da cerimónia, entrando todos em fila para os lugares dianteiros. No final, nenhuma mulher saía enquanto a Igreja não se esvaziasse dos homens.
O ritual ainda hoje existe, embora quebrado por muitos dos mais novos.
Eu só tinha sete anos, não percebia o porquê, mas tinha a certeza que isto não estava certo. E hoje, continuo a ter a certeza que isto não está certo. Onde estão as mulheres? Onde estão as mulheres no tempo da Igreja dos Homens? Ninguém as vê! Mas elas andam por aí.
Discretas. Silenciosas. No seu recato, conforme aprenderam com séculos de cultura social submissa. É assim que procedem, pois é assim que sobrevivem.
Ninguém dá conta delas, tratam da limpeza, das flores, do chá, curiosamente são uma maioria na transmissão da catequese de infância, o que parece um absurdo… ninguém dá conta delas, mas quando falham… onde estão as “Santas Mulheres”?!
Como é possível à instituição “Igreja” que tem como base a mensagem da Boa Nova, onde todos (homens, mulheres, ricos, pobres) somos irmãos, falhar no mais básico do seu conceito, continuando a tratar os seus fiéis de maneira diferenciada?
Porquê vedar o acesso das mulheres a certos sacramentos como o da ordenação, impedindo-as de participar nas decisões da Igreja? Qual é o requisito que falta às mulheres do povo de Deus para não poderem aceder a este sacramento? Afinal onde está a fraternidade e a justiça da pregação do Evangelho? Não se pode anunciar a Boa Nova e depois não a pôr em prática, em nome de qualquer “Poder” engendrado pelos Homens.
Segundo Frei Bento Domingues “Existe uma comissão para estudar a hipótese de as mulheres serem ordenadas diaconisas (…) composta paritariamente por seis homens (bispos e sacerdotes) e seis mulheres (religiosas e leigas) (…) de representatividade eclesial muito desnivelada”; claro, digo eu, como não poderia ser desnivelada, pena que elas, as diaconisas, tenham sido extintas após os primeiros tempos do cristianismo.
Não resisto a ler esta passagem, também de Frei Bento, que para mim é esclarecedora do momento em que a Igreja se encontra: “A discussão dos Ministérios Ordenados na Igreja é muito curiosa: para ordenar homens casados, dizem que não há nenhum obstáculo dogmático. Para deixar continuar no ministério presbiteral os que decidem casar – e dispondo já de prática pastoral – também não há obstáculo dogmático, mas nem pensar! Para as mulheres há obstáculos de tradição. O resultado é o mesmo. O povo cristão, com direito à Eucaristia, é privado, em muitos lugares, da sua celebração. Tudo isto porque o Sacramento da Ordem já não sabe para que lado se há-de virar.”
Estamos no tempo dos Sinais. Que uma Luz, pequena que seja, nos tire desta escuridão. Não é a sede do poder decisório para as mulheres! Longe disso!
É a sede da Justiça, da Coerência da mensagem cristã, da Fraternidade entre todo o povo de Deus a caminho e do Mandamento Novo que nos diz “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”.
Paula Varandas, 8 de Dezembro de 2016