Vimos de Longe, de muito longe…» (Data correcta)
O que andámos p’ràqui chegar!.
Já demos a volta ao Mundo muitas e muitas vezes em demanda de “terras novas”. De todas as vezes dissemos: a Terra Nova!, é a Terra onde corre o leite e o mel que procurávamos! Mas, afinal, era Terra Velha!… Os mesmos homens, os homens de sempre, Terra ocupada, Terra de concorrência, sempre um povo a mais, a desalojar!… Canã, Índias Orientais e Índias Ocidentais, índios, peles vermelhas, caras pálidas, negros da Guiné, Terra dividida, terra a conquistar, Terra-de-Concorrência!.., Ou então, Terra-do-Apartheid, Terra-em-Guerra, Terra-do-Fogo…
Também já na Igreja passámos por isso, depois de Israel. Peritos em Humanidade, já nada nos espanta. Depois dos Descobridores e dos Conquistadores, vieram os Revolucionários contra o Inimigo do Interior, depois do Mouro o Judeu, depois do Selvagem-Primitivo o Burguês-Rico-Explorador. Já passámos por isso: a Inquisição? a Censura, depois das Cruzadas, os Autos-de-Fé, as Fogueiras, a Tortura, a Masmorra. Sim, o KGB, o Gulag, a CIA e a Caça às Bruxas!… A Decadência e os seus Bodes-Expiatórios.
Já demos a volta ao Mundo e não vimos na da de novo sob o Sol; só trabalho dos trabalhadores suspirando por uma sombra ou pelo salário no fim do mês eternamente adiado… Desde os Sacrificados do Danúbio até aos Sacrificados da Revolução e aos Sacrificados da Recuperação, por causa desse bandidos dos Americanos, desses bandidos dos Russos, estuporados Reaccionários, Imperialistas, Latifundiários, estuporados Vermelhos, totalitários estalinistas… Estado Novo, Sociedade Nova, Sociedade Socialista, Homem-Novo-Terra-Nova, Mundo-Livre, Civilização Ocidental… nunca mais acaba a verborreia, nunca mais acaba!… Nada de novo sob o Sol! nada de novo!
Mas, e os Cristãos? Deu-lhes agora a mania da Revolução? ou a mania da Anarquia?!… Ultimamente, sempre a reboque, à retardador?!,..
Tempos de Confusão5 tempos da Crise, mas em nada diferentes dos dias de Jesus. A Crise não pode ser para os Cristãos um álibi. A Crise, por exemplo, não justifica o nosso Medo, não explica a nossa Mediocridade…
Do que estamos precisados urgentemente é de salvar a Alma, retemperar o nosso Carácter, e de nos situarmos face ao Mundo em termos de Autenticidade. Depois de Jesus Cristo é falso procurarmos aqui uma Terra Nova, a Terra Nova sob Céus Novos. Aqui? Sim, aqui! Daremos a volta ao Mundo e voltaremos ao mesmo sítio! Nem Agora, nem Aqui! Temos muito que andar: “Vimos de Longe, de muito longe…». Vamos p’ra Longe, p’ra muito longe! O que andámos p’ràqui chegar! O Poeta intui sempre melhor que o Filósofo. Esta canção do Poeta, no fundo, é a nossa Esperança “laicizada” que teima em não servir os Esquemas da Actualidade.
Voltamos, então, ao Espiritual, ao Religioso? Tudo depende do que entendermos por Espiritual, tudo depende do que entendermos por Religioso. Se por Espiritual entendemos “nas nuvens”, em “céus imaginários” ou num “neo-individualismo”, então não: “Pra pior já basta assim!”. Se por Religioso entendemos “fideísmo” ou “deísmo”, então já nos basta a Religiosidade Popular e a Maçonaria, Mas se por Religioso entendemos a Religião da Fé, da Esperança e do Amor se por Espiritual entendemos a força e o poder do Espírito Santo habitando em nós, animando-nos e movendo-nos, inspirados e inspiradores, nas grandes lutas do Reino de Deus, em que “nem esgrimimos no ar” nem lutamos contra “seres de sangue e de carne”, mas contra as Mentalidades Obscuras, obscurantistas, poderes da Malícia e força do Pecado do Mundo, então, ”sim” Então, e preciso voltar ao Espiritual, reconverter-nos ao Religioso» e “o Século XXI será Religioso ou não será”…
“Nem só de pão vive o Homem, mas de toda a Palavra que vem da boca de Deus!”. Vimos isso na Revolução de Maio 68 numa Sociedade de Consumo. Estamos a ver o mesmo na Sociedade da Crise, nos dias da Inflação ao contrário em que há as Coisas e não há Dinheiro para as comprar; há pouco Dinheiro em circulação?!!! Mas que se passa com a Inacção que se tornou Estagnação?
A procura desesperada do Pão fez a Servidão dos Séculos XIX e XX. A mesma procura desesperada do Pão fez as Revoluções Socialistas… Uma não tirou a Servidão à outra, antes a aumentou e a tornou cada dia mais intolerável!
Sim, sim, no fundo, havia a intuição de que toda a questão era interior. Só que se enganaram no Adversário e na Terra a conquistar. Adversário não era o Mouro. Sim, o Adversário estava no Interior. Só que também não era o Judeu. O Adversário não era o Indiano, o Indú, o Amarelo, o Negro. A exploração e o saque das suas terras nada resolveram, não só não responderam às carências dos Brancos-Europeus-Cristãos, como as agravaram!… O Adversário não era o Outro. Mas também não era o Rico, o Burguês, o Explorador ! Não era. Essa atitude de “caça às bruxas” só encheu as prisões, criou estados-policiais, restaurou a Guilhotina, o Terror, a Inquisição, a Censura, os Campos de Concentração e de Reeducação, mas nada resolveu. Não, o Adversário não era o Comunista, o Subversivo, o Bolchevista, o Revolucionário! Não era! Não é! Essa atitude de “caça às bruxas” encheu as prisões, rebentou com as democracias e multiplicou o Arsenal desmedidamente! A Questão não era de Esquerda, a Questão não era de Direita, nem do Centro. A Questão não era, não é Política, nem Económica. Não e! NÃO É!
A QUESTÃO É INTERIOR! A QUESTÃO É PESSOAL E COMUNITÁRIA! A Terra Nova está no Homem, a Terra Nova é o Homem!
Sim, há uma Luta. E a Luta é interior! 0 REINO DE DEUS ESTÁ DENTRO DE VÓS, ENTRE VÓS!
Ê um NOVO GÉNESIS! É um NOVO ÊXODO! que não se vai inventar, porque já veio. Trata-se de descobrir o Tesouro. perdido nestas sucessivas remexidelas históricas. Também não se trata de o procurar atrás, como quem volta ao passado. Trata-se de ir ao fundo, às fundações. E o primeiro passo será libertar-nos de todos os mitos modernos mundanos ou eclesiásticos (clericais!) que “laicisaram” a nossa Esperança ou que a encadearam em “esquemas escolásticos”. Enquanto não nos libertarmos, acabaremos por andar às voltas sem sair do sítio. Diante de nós; nesta Quaresma estão as Águas da nossa Renovação, as Águas de todas as Páscoas, onde a nossa Profissão de Fé varrerá todo o Lixo dos olhos e do coração» Para o Testemunho, sim, para um Novo Martírio em que seremos Mártires, e nunca mais faremos Mártires!… A Paixão de Cristo vem no termo da Quaresma, e na Cruz já há toda a Glória que se verá na Ressurreição! Um Mundo Outro começou! É tempo de cantar a Liberdade, de fazer a Liberdade!
Homilia do Pe Leonel na Serra do Pilar, no 2º Domingo da Quaresma, em 1984.03.18