A visita dos irmãos

Os primeiros cristãos viajavam muito. Veja-se só o apóstolo Paulo que correu todo o Mediterrâneo oriental e chegou depois a Roma! E de Israel a Roma é o dobro da distância do Porto a Roma! E naquele tempo não havia nem aviões, nem comboios, nem automóveis.

Paulo quis até vir à nossa Península Ibérica (Rm 15,24)! Mas não conseguiu.

Os cristãos visitavam-se naquele tempo. João, o Evangelista, diz assim na sua 3ª Carta: “Alegrei-me muito com a chegada dos irmãos…” (v. 3).

Eu faço minhas as palavras dele: “Alegro-me muito com a chegada dos irmãos …” de Fonte Arcada. Ainda tinha (tenho) nos ouvidos aquela melodia que me encantou numa manhã de um domingo cheio de sol… Já vai lá 1 ano.

Penso que os cristãos deviam visitar-se, conhecer-se, enriquecer-se até com o que os irmãos têm de bom. Na Igreja primitiva, as comunidades tinham sempre preparada a logística necessária para acolher os irmãos que passavam. Os que chegavam, munidos de “cartas de recomendação” assinadas pelos seus epíscopos, apresentavam-se nas comunidades por onde passavam e eram atendidos com o cuidado que lhes mereceria o próprio Jesus. Foi assim que “dar pousada aos peregrinos” — e esta palavra era muito alargada: tanto referia os peregrinos religiosos como os simples viandantes) — foi assim que “dar pousada aos peregrinos” entrou no rol das obras de misericórdia, ao lado, por exemplo, de “Dar de comer a quem tem fome”. “Bela coisa é a hospitalidade!”, dizia S. Gregório de Nazianzo, bispo do séc. IV.

Na primeira metade do séc. VI, S. Bento, talvez o santo de maior devoção no Minho, escreveu assim na regra dos beneditinos: “Todos os hóspedes que cheguem ao mosteiro sejam recebidos como se fossem o próprio Cristo, e de modo que ele pudesse voltar a dizer “era peregrino e acolheste-me” (Mt 25,36).

Tudo isto vinha de trás, muito de trás, dos primeiros tempos cristãos, da própria boca de Jesus e dos primeiros escritos. Didaké, palavra grega que quer dizer ensino, serviu de título a um texto certamente ainda do 1º século. Nesse livrinho, ensinava-se o viver cristão, regras importantes do viver cristão. A certa altura, diz assim: “Todo aquele que vier ao vosso encontro, seja acolhido em nome do Senhor. Se for viajante, ajudai-o quanto puderdes. Não permanecerá convosco mais que três dias. Se estiver mais que três dias, tenha um ofício, trabalhe e coma. Se não tem ofício, resolvei como vos parecer melhor; mas que não viva ocioso no meio de vós” (XII, 1-4).

Meus irmãos:

É verdade que neste nosso tempo, as comunidades cristãs parece que têm medo do diferente e não dão conta do fechado em que vivem. A riqueza do diferente e a pobreza do fechado!

Uma criança que viva fechada, sem referência aos pais, aos avós, a outras crianças, uma criança assim não cresce, não se forma. Mas não só uma criança; também um adulto, uma instituição, uma empresa, um país, mesmo uma cultura; sem criatividade, sem andar para a frente, não crescem, morrem. Uma comunidade cristã fechada, sem contacto com outras, que não se deixa interpelar nem interpela nada nem ninguém, não percebe a riqueza que existe ao lado. Como pode uma criança — palavra que quer dizer em criação, em crescimento — viver fechada num quarto? Como pode ela saltar, brincar com quem e com quê? E o idoso a mesma coisa: é um drama do nosso tempo não sabermos o que fazer a um idoso! Eu começo a perceber o que isso é!

Paulo, S. Paulo, carregou sobre si tudo isto: a pé e de barco, sozinho e acompanhado, adoeceu sem lá chegar, sofreu um naufrágio, esteve preso, trabalhava nos sítios onde passava e até na oficina da família que o recebia (At 18,3).

Que bom termos estado o ano passado naquela tão bela Igreja românica de Fonte Arcada, que foi de um mosteiro beneditino! Que bom estarmos hoje aqui nesta também bela igreja, que foi de um mosteiro agostinho ou crúzio!

Mas melhor que isso é estarmos nós, Fonte Arcada, Oliveira, Pepim e Serra do Pilar, a orar e a cantar,  a comer do mesmo pão à roda da mesma mesa. “A unidade é uma coisa deliciosa, a Fraternidade é uma beleza inefável! A Unidade entre os Irmãos é uma coisa deliciosa! Como é bom os irmãos viverem unidos e reunidos!” (Salmo 133). Melhor que o Salmista eu não sei dizer.

Arlindo de Magalhães, 19 de Julho de 2015

This slideshow requires JavaScript.

[19.Julho.2015: Visita das comunidades de Fonte Arcada, Oliveira e Pepim à Serra do Pilar. Celebração da Eucaristia]

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *